Há precisamente 70 anos, entre 25 e 28 de Agosto de 1948, a cidade polaca de Wroclaw acolheu o Congresso Mundial dos Intelectuais pela Paz, importante expressão do movimento mundial que, dois anos depois, se conjugaria em torno do Conselho Mundial da Paz.
Este congresso reuniu centenas de delegados, oriundos de 45 países, entre os quais se contavam destacados intelectuais e artistas, como Pablo Picasso, Eugénie Cotton, Irène Curie, Paul Éluard, Jorge Amado, Henri Wallon, Anna Seghers, Aimé Cesaire, Andersen Nexø e György Lukács. As delegações mais numerosas provinham da própria Polónia e também dos Estados Unidos da América, Reino Unido, França, Itália e União Soviética.
Portugal, apesar da repressão da ditadura fascista, também esteve representado. Integravam a delegação portuguesa o físico Manuel Valadares, o compositor Fernando Lopes-Graça, o escritor Alves Redol, os médicos João dos Santos e Hermínia Grijó e a bióloga Maria da Costa. Da tribuna do Congresso, Alves Redol garantiu que a delegação portuguesa traduzia o «sentimento de todos os escritores, artistas e homens de saber do nosso país realmente amigos da paz».
A participação de partidários da paz portugueses no movimento que, a partir de finais de 1950, se constituiria no Conselho Mundial da Paz foi constante: em 1949, no Primeiro Congresso Mundial dos Partidários da Paz, em que participaram mais de 2000 delegados provenientes de 72 países, o físico português Manuel Valadares esteve particularmente activo na sua preparação. O mesmo cientista passou a integrar, em Novembro de 1950, o Conselho Mundial da Paz constituído no Segundo Congresso Mundial da Paz, realizado em Varsóvia. Nos anos seguintes juntaram-se-lhe outras personalidades, como Ruy Luís Gomes, Maria Lamas, Armando Castro, Urbano Tavares Rodrigues, Silas Cerqueira ou, já após a Revolução de Abril de 1974, o Marechal Francisco da Costa Gomes, que foi Presidente da República Portuguesa.
Paralelamente à participação em eventos e movimentos internacionais, a luta pela paz desenvolveu-se em Portugal desde a década de 40 do século XX, apesar da repressão movida contra o movimento da paz e seus activistas pela ditadura fascista. Logo em 1950, em torno da recolha de assinaturas para o Apelo de Estocolmo, pela proibição das armas atómicas, foram criadas por todo o País (em empresas, serviços, escolas, localidades e associações) comissões para a defesa da Paz. Em Agosto, é criada a Comissão Nacional para a Defesa da Paz, da qual faziam parte, entre muitos outros, o médico e Prémio Nobel Egas Moniz, o professor Ruy Luís Gomes, o escritor Ferreira de Castro, o compositor Fernando Lopes-Graça, a escritora Maria Lamas, o matemático José Morgado e a engenheira Virgínia de Moura.
Tal como sucedia a nível internacional, nesta comissão convergiam personalidades com diferentes concepções políticas e religiosas. Nestes primeiros anos (e à semelhança do que ainda hoje sucede), a luta pela paz não se limitou ao movimento vocacionado especificamente para o efeito, agregando outros movimentos e organizações democráticas, como o Movimento de Unidade Democrática Juvenil, o Movimento Nacional Democrático ou a Associação Feminina Portuguesa para a Paz. Juntas, estas organizações, com ramificações de Norte a Sul do País, levaram a cabo muito importantes acções em prol da paz, do desarmamento e da solidariedade, enfrentando abertamente eixos centrais da política externa da ditadura e sofrendo por isso constantes perseguições. Repressão a que o 25 de Abril de 1974 pôs fim, continuando o movimento da paz a realizar em liberdade e em democracia a sua imprescindível intervenção, que prossegue até aos dias de hoje.
Num momento, como aquele em que vivemos, marcado pelo agravamento das tensões e da militarização das relações internacionais; pelo incremento da ingerência, das operações de desestabilização e guerras de agressão; pelo desrespeito pela independência dos Estados, pela soberania e os direitos dos povos; pelo aumento das despesas militares e da corrida aos armamentos – em resultado da política belicista promovida pelos EUA, a UE, a NATO e os seus aliados –, importa ter presente o exemplo dos partidários da paz que, em tempos igualmente difíceis, souberam, apesar de diferenças, determinar a ameaça e o perigo principal e unir forças contra uma nova guerra, em defesa da paz e da sobrevivência da Humanidade. Levantemos alto e continuemos hoje e no futuro o seu legado e luta.
28 de Agosto de 2018
Conselho Português para a Paz e Cooperação